“Não me pagam para isso!”
Já ouviu esta afirmação?
Quantas vezes a ouviu?
Ontem ouvi, mais uma vez esta afirmação e mais uma vez
senti que alguém está a viver num mundo diferente do meu. Vou contar-lhe o
contexto.
Fui convidado para falar para uma audiência de cerca de 170
pessoas. Estavam sentados no auditório da Fundação Champalimaud, os quadros
superiores de uma das 5 maiores farmacêuticas a nível mundial. O espaço físico
era fantástico pois foi a primeira vez que me deram a oportunidade de ser feliz
também neste espaço tão inspirador. A responsabilidade era, como habitualmente,
enorme, pois quem me conhece sabe que faço questão de deixar sempre muito valor
em todos os participantes de qualquer ação para a qual tenho a sorte de ser
convidado.
O meu novo desafio era ter uma audiência constituída por
100% de elementos de nacionalidade Alemã, pois é uma língua que não domino a
99%. Na preparação do evento foi-me dito que eu falaria na minha língua, o
Português e que teria uma tradutora que “descodificaria” a minha mensagem para
Alemão.
A minha tradutora era a Carla (nome fictício), e pensei em
reunir-me com a Carla para treinarmos o discurso com o objectivo de termos um
excelente desempenho, o que é habitual e muito expectado numa audiência como a
Alemã. A Carla é uma pessoa muito extrovertida, dinâmica e comunicativa o que
são factores que temos em comum. O que também é excelente para quem quer passar
uma mensagem comum.
Quando começámos a treinar apareceram alguns desafios. Afinal a apresentação teria que ser feita em Inglês e depois traduzida para Alemão. A
Carla estava à espera que o meu discurso estivesse escrito a 100% para que ela
o pudesse traduzir para um documento e que posteriormente este fosse um
suporte de leitura. Eu tentei transmitir à Carla que a minha comunicação estava
estruturada e que cerca de 80% da mesma estava escrita, embora ela tivesse que
adaptar cerca de 20%. Comecei a ver a Carla a mexer-se muito na cadeira e a
ficar com suores frios, a seu ritmo de voz mudou e passou a fazer mais
afirmações que questões.
Estes comportamentos são típicos de quem se está a sentir
com baixa confiança e desconfortável em relação a alguma coisa que vai
acontecer e que ela a viu a correr mal, em alguns dos seus pensamentos.
Pensei, “A Carla começou com o processo de activação
descontrolada dos seus medos e vamos ter que tratar deste assunto, pois caso
não o faça é bem provável que a minha audiência e o meu cliente não fiquem com
muito boa impressão do memento!”
Foi então que lhe disse: ”Carla, eu estou a compreender o
que está a sentir. Vamos seguramente encontrar uma forma para fazermos um
excelente trabalho.”
Foi aí, quando a Carla percebeu que eu não ia desistir, que
disse: “Pedro, desculpe mas não me pagam para isso!”
Esta é uma frase que normalmente vem de quem está
comprometido em não crescer e aceitar novos desafios, pois estes estados são
frequentes quando fugimos para a nossa zona de conforto em vez de aproveitarmos
para crescer ultrapassando mais um desafio.
Também confesso que pensei “Então a Carla é tradutora de
Alemão ou Leitora de Alemão?” mas não verbalizei.
Expliquei à Carla que nos tempos que correm podemos escolher
pensar que não nos pagam para fazer coisas que ainda não fizemos muitas vezes,
temos apenas que encarar com confiança as suas consequências.
Dei-lhe a minha perspectiva, disse-lhe que antes até
podíamos pensar assim, mas agora temos que aprender a pensar que, se nos
contactam para trabalhar é bom, se nos contratam é muito bom e se nos pagam é
excelente.
Também lhe expliquei que só nos contactam quando em tudo o
que fazemos, fazemos bem, mesmo aquilo que nunca fizemos. O que vai ser bom para os nossos clientes será
seguramente para nós imediatamente ou não. Uma coisa é certa, se não o fizermos
bem, não ajudamos ninguém a nos contactar para um futuro trabalho.
Perguntei-lhe de seguida se ela estava contente com o número
de trabalhos para os quais é contactada, o que me confessou que atualmente são
metade daqueles que tinha. Pergunte-lhe se queria mudar esse factor, o que ela
me respondeu: “Ajuda-me?” eu respondi “não há ninguém neste mundo que eu queira
ajudar mais neste momento. Embora seja uma decisão que só pode ser sua. Quer sair
daqui orgulhosa ou com um sentimento de frustração?” Ela respondeu: “Vamos a
isso!”
A Apresentação correu muito bem, pois fomos uma excelente
equipa. Os Alemães, entenderam, sorriram e aplaudiram.
A Carla no final deu-me um abraço bem forte e disse :
“Correu tão bem. Obrigado. Somos uma equipa Fantástica. Quero fazer isto muitas
vezes com o Pedro”
Agora a Carla sabe que fazer bem o que ela faz é bom, mas
fazer o que ainda não se fez é maravilhoso, mesmo que não nos paguem por isso.
Até porque só lhe vão pagar mais quando ela tiver a capacidade de entregar
mais.
Não podemos ser nós a condicionar o nosso crescimento,
condicionando estes maravilhosos momentos de realização pessoal .
Faça uma coisa
desafiante todos os dias e arrisque-se a sentir-se mais realizado,
independentemente se alguém lhe paga para isso. Mas se lhe pagarem ainda
melhor.
Eu também agradeço ao meu cliente por me ter pago para me sentir tão feliz no final do meu dia. Adorei a experiência de estar naquele inspirador auditório, de ter falado para uma audiência nova com pessoas tão competentes e exigentes e finalmente por ter encontrado a Carla, pois tive a oportunidade de lhe mostrar uma forma diferente de ver a mesma coisa e de ter permitido que ela tenha vivido um momento que espero seja repetido muitas vezes na sua vida.
Seja feliz, se faz favor! J
Forte abraço
Pedro Malaca
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